O
Aletsch, na Suíça, já perdeu 3,5 km e teve espessura reduzida em
300 metros
Em
1678, os habitantes do pequeno vilarejo de Fiesch fizeram uma
promessa solene de rezar todos os anos contra a expansão do glacial
de Aletsch, um dos maiores do mundo. Com 21 km de extensão, a
geleira aumentava a cada ano a sombra sobre a pequena cidade.
Trezentos
e trinta e cinco anos depois, os habitantes do povoado alpino mudaram
o tom da oração: rezam para que a geleira não derreta, o que
significaria o fim de Fiesch em decorrência de uma inundação de
proporções bíblicas.
Desde
o século 15, Aletsch já perdeu mais de 3,5 km e a cobertura de gelo
foi reduzida em 300 metros de espessura. O caso dessa geleira não é
o único. Espalhados pelos Alpes nos territórios da Suíça, da
Áustria, da França e da Itália, locais conhecidos pela presença
de neves eternas e geleiras monumentais começam a sofrer uma dura
transformação.
Na
sexta-feira, os cientistas do IPCC confirmaram que o homem é o
principal responsável pelo aquecimento da Terra e que, se nada
mudar, até 2100 a temperatura média do planeta pode aumentar em até
4,8 °C.
Longe
das conferências da ONU, os habitantes não têm dúvidas de que a
paisagem mudou e que o aquecimento global é uma realidade
incontestável. "Não precisamos medir nada. É só olhar",
disse Hans Muller, dono da única padaria local, apontando para fora
de sua loja. O negócio é da família desde 1830.
O
que se vê a olho nu é reforçado pelos últimos informes sobre o
clima. Para cientistas, existe o sério risco de que até 2100 o
volume total de glaciais do planeta diminua de 15% a 55%, num cenário
mais otimista, chegando a 85% num mais pessimista.
Martine
Rebetez, especialista em mudanças climáticas nos Alpes e membro do
Instituto Suíço de Pesquisa da Université de Neuchâtel, afirma
não ter dúvidas sobre o que está ocorrendo. "Nos Alpes, todos
os glaciais estão retrocedendo."
Do
lado francês dos Alpes, a história não é muito diferente. As
paróquias francesas também apelaram às forças divinas para frear
o avanço de geleiras que ameaçavam há quase 400 anos engolir
vilarejos. Em 1643, os habitantes de Chamonix organizaram um
procissão depois que uma parte da geleira local destruiu um ponto da
cidade. No ano seguinte, o bispo de Genebra assumiu a tarefa de lutar
contra o gelo e passou a benzer o glacial a cada ano.
Agora,
o Mer de Glace – o maior glacial da França, com uma superfície de
30 km2 – perde a cada ano entre 4 e 6 metros de espessura e cerca
de 30 metros de tamanho. Entre 1905 e 2005, o Mar de Gelo perdeu 120
metros de espessura. O local que serviu de cenário para romances
como Frankenstein, de Mary Shelley, sofreu uma contração desde 1850
de 2,5 quilômetros. O recuo do "mar" deixou em seu lugar
pedra.
Esqui.
As mudanças também afetam os bolsos e orçamentos de cidades
inteiras nos Alpes. Nos próximos 20 anos, metade das estações de
esqui da Suíça poderá ser obrigada a fechar. Motivo: a falta de
neve. O resultado pode ser um desastre financeiro para regiões que
dependem do turismo de inverno
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